11 de setembro e as cicatrizes geopolíticas em duas américas
- Editor BN

- 11 de set.
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Atualizado: 13 de set.
O calendário reserva ao dia 11 de setembro um peso histórico que ultrapassa fronteiras e carrega em si duas narrativas distintas, mas entrelaçadas pela lógica do poder global: em 1973, no Chile, o bombardeamento do Palácio de La Moneda e a deposição violenta do presidente Salvador Allende inauguraram uma das ditaduras mais duras da América Latina; em 2001, os ataques terroristas contra o World Trade Center e o Pentágono redesenharam a política de segurança mundial e reforçaram a centralidade dos Estados Unidos na chamada “guerra contra o terror”.

O 11 de setembro latino-americano
Na manhã de 1973, Santiago do Chile foi tomada pela fumaça das bombas lançadas sobre La Moneda. O governo de Allende, eleito democraticamente, caiu diante de um golpe militar conduzido pelo general Augusto Pinochet. Por trás da ação, a sombra norte-americana era evidente. Documentos desclassificados décadas depois confirmaram o envolvimento direto da CIA em operações de desestabilização econômica e política no Chile, em plena Guerra Fria.

O Chile foi transformado em laboratório do neoliberalismo, sob influência de economistas da Escola de Chicago e sob a tutela de Washington. A “ordem” imposta pelas baionetas era parte de um projeto continental: impedir que a América Latina ousasse trilhar caminhos de autonomia econômica e social. O golpe no Chile não foi um episódio isolado, mas um elo da engrenagem de golpes que, sob o discurso de combate ao comunismo, reforçavam a condição da região como quintal dos Estados Unidos.
O 11 de setembro estadunidense
Quase três décadas depois, em 2001, o drama se repetiu em outra escala. Dessa vez, o alvo era o próprio coração do poder estadunidense. Os aviões que atingiram as Torres Gêmeas e o Pentágono escancararam a vulnerabilidade do império. A resposta veio rápida e avassaladora: a doutrina Bush inaugurou a era das guerras preventivas e da expansão ilimitada da vigilância em nome da segurança nacional.
O 11 de setembro de 2001 também teve implicações diretas para a América Latina. O combate ao terrorismo justificou a ampliação da presença militar dos EUA na região, em especial na Colômbia, onde o Plano Colômbia foi fortalecido sob o pretexto de enfrentar narcotráfico e guerrilhas. O terrorismo serviu, em parte, como nova roupagem para velhas estratégias de controle geopolítico.
Tramas de bastidores e memórias cruzadas
Se em 1973 o 11 de setembro foi o dia em que Washington atuou nos bastidores para derrubar um governo considerado incômodo, em 2001 foi a vez de os Estados Unidos experimentarem em seu território a violência política em escala global. Em ambos os casos, a data marcou o mundo com uma mensagem de poder e medo: na América Latina, a mensagem de que qualquer projeto de soberania nacional poderia ser esmagado; nos Estados Unidos, a mensagem de que nenhum poder, por mais imperial, estava imune a ataques.

O paradoxo é que, em diferentes tempos e espaços, a lógica de bastidores pareceu convergir. O Chile sofreu a imposição de um modelo econômico e político sob patrocínio norte-americano. Já os EUA, após os atentados, instrumentalizaram a tragédia para expandir sua influência global sob a bandeira da luta contra o terror.
Uma data de memórias amargas
Assim, o 11 de setembro é uma data que concentra em si as ambiguidades da geopolítica. De um lado, revela a América Latina como palco de experiências autoritárias e neoliberais sob tutela externa. De outro, expõe os Estados Unidos, por um breve momento, na condição de vítimas, mas logo convertendo esse sofrimento em justificativa para reforçar sua hegemonia.
O que resta é a memória amarga de que a história se faz, muitas vezes, nos bastidores do poder, e que o destino das nações pode ser selado por interesses que vão muito além de suas fronteiras.





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